DIA INTERNACIONAL DA MULHER

Mesmo com aumento de projetos e leis sancionadas, proteção à mulher ainda é um desafio

Dia Internacional da Mulher: Mesmo com aumento de projetos e leis sancionadas, proteção à mulher ainda é um desafio

O Dia Internacional da Mulher será celebrado no próximo domingo, 8 de março. Segundo Adélia Pessoa, presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a data foi instituída para provocar, na sociedade, a reflexão acerca dos avanços e desafios que ainda persistem no campo da defesa dos direitos da mulher.

“O objetivo da data é discutir o papel da mulher na sociedade. O esforço é para tentar diminuir e, quem sabe um dia, terminar com o preconceito, a desvalorização e a violência contra a mulher. Muito foi conquistado nessa caminhada de lutas, mas ainda há um longo caminho a percorrer”, avalia a advogada.

Entre os desafios ainda enfrentados, ela cita a disparidade salarial em relação aos homens, a dupla jornada de trabalho e a sub-representação da mulher nos espaços de poder e na política. “É preciso repetir sempre que os efeitos da relação trabalho e família manifestam-se apenas entre as mulheres e não entre os homens; oferta de trabalho e qualificação determinam o trabalho masculino, enquanto o feminino enfrenta condicionantes familiares.”

“Urge salientar que um dos maiores desafios da contemporaneidade é promover a articulação entre família e trabalho, além de continuar implementando medidas para eliminação de desigualdades e discriminações nos ambientes de trabalho”, acrescenta Adélia.

Avanços e retrocessos na defesa da mulher

Entre 2018 e 2019, o número de projetos de combate à violência doméstica e familiar saltou de 42 para 279 na Câmara. No Senado, foram 35 projetos aprovados em prol das mulheres. Além disso, entraram em vigor leis que tratam da notificação dos casos por profissionais de saúde (13.931/19), da apreensão de arma de fogo do agressor (13.880/19), da prioridade na matrícula escolar dos filhos (13.882/19), da prioridade no processo de separação (13.894/19), entre outros recortes.

Adélia Pessoa avalia que as leis de prevenção e assistência à mulher vítima de violência têm tomado novas dimensões. “Do ponto de vista legislativo, assistimos à edição de uma série de leis que tipificam novos crimes ou estabelecem um tratamento criminal mais rígido para os autores de agressão, ao lado de sua reeducação através de grupos reflexivos com orientação interdisciplinar de psicólogos e assistentes sociais.”

“Frente às dificuldades do momento atual, não só em termos de crise econômica, mas também pela crise de valores, pelo ódio ao pensamento plural, pela visão maniqueísta de alguns setores religiosos que atacam normas já conquistadas, pela campanha de descrédito de algumas instituições que vem sendo propagado tão fortemente pelas redes sociais, verificamos um refluxo dos avanços e de aumento de dificuldades de alguns segmentos na participação social no controle de políticas públicas”, analisa a advogada.

Segundo ela, há uma grande distância entre as leis e a realidade social, o que exige uma luta constante para que tais normas sejam efetivamente concretizadas. “Nosso papel é incentivar, trabalhar para que as pessoas lutem para a concretização e aperfeiçoamento das normas, não desistindo de avançar em nossa caminhada, que deve ser coletiva”, propõe Adélia.

Mulheres duplamente vulneráveis

Mulheres transexuais figuram com índices alarmantes nos casos de violência de gênero no Brasil. Diariamente, 11 pessoas trans são agredidas diariamente no País, segundo dados do Dossiê dos Assassinatos e da Violência contra Travestis e Transexuais Brasileiras em 2019, levantados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais – Antra e pelo Instituto Brasileiro Trans de Educação – IBTE.

“O Brasil continua sendo o campeão mundial de crimes motivados pela transfobia. Um grande percentual dos assassinatos de transexuais e travestis ocorre no Brasil, em uma política disseminada, intencional e sistemática de eliminação da população trans, motivada pelo ódio, abjeção e nojo”, observa Adélia.

Ela atenta que o cenário já é alarmante e ainda há subnotificação de casos de transfobia. “As organizações militantes enfrentam uma série de dificuldades em sua atuação, o que indica que os números reais da violência são ainda maiores do que os apresentados.”

A advogada observa, ainda a partir do Dossiê divulgado em 2019, que a transfobia tem migrado do epicentro do ódio para assumir outras formas, em que matar seria o ponto mais extremo e a violência passa a se intensificar sob outros aspectos, simbólicos, psicológicos, estruturais e institucionais.

Caminhos para o enfrentamento da violência

Segundo o Atlas da Violência de 2019, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea, houve um aumento de 30,7% no número de feminicídios no Brasil entre 2007 e 2017. Cerca de 13 mulheres são assassinadas diariamente. Ao todo, 4.936 foram mortas em 2019, o maior índice desde 2007.

Para Adélia Pessoa, leis criminais não bastam se o sistema de justiça é insuficiente para diminuir os índices de violência de gênero. “Há de se trabalhar em redes de serviços de atendimento, proteção, segurança, educação e saúde. Isso está sendo construído em alguns estados e municípios. Entretanto, quando a escassez de recursos se instala, políticas públicas de atendimento aos mais vulnerabilizados refluem.”

Adélia frisa o papel fundamental da educação. “Sabemos que mudanças dos padrões sexistas, de condutas e atitudes preconceituosas não ocorrem como consequência automática da sociedade democrática. Assim, há a necessidade de repensar a educação que está sendo ministrada e como as unidades escolares, em todos os graus, estão construindo seus saberes de forma integrada, promovendo o respeito à dignidade humana.”

Ela realça que a temática referente a gênero deve ser operacionalizada tanto no currículo explícito das escolas como no currículo oculto, que tem na filosofia da instituição de ensino e dos seus mestres sua aplicação implícita. Isso porque os ensinamentos para equidade de gênero podem ser validados ou invalidados, consciente ou inconscientemente.

“A educação deve ser direcionada à vivência da igualdade, não podendo ser produtora e reprodutora da discriminação e violência de gênero”, defende Adélia. “A educação, formal ou não formal, produz as representações como um processo de construção social em um sistema de significações. É pela educação que diferenças sexuais se transformaram em desigualdades culturalmente constituídas – no fundo o que é necessário é a desconstrução de padrões culturais sexistas.”


Fonte: 04/03/2020 Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM

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