A JUSTIÇA E O TEMPO

A célebre frase de Rui Barbosa parece ressoar diuturnamente aos profissionais do Direito e também a (alguns) legisladores, que tentam a qualquer custo vencer o tempo e proporcionar aquela justiça que não seja tardia, pois, se na demora não se faz justiça, a lógica faz crer que na celeridade (respeitado o devido processo legal formal e substancial) há a celebração da mais virtuosa justiça.

Nessa toada, em 1969 o Pacto de San José da Costa Rica homenageia o princípio da celeridade, cuja ratificação no Brasil se deu em 1992. Além disso, no ano de 2004 o poder constituinte derivado estabeleceu através da Emenda 45, que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação - art. , LXXVIII, CF/1988.

Tal regra destina-se não somente aos profissionais do Direito e aos administradores públicos, mas, sobretudo, aos legisladores, na criação de leis que favoreçam o bom e rápido desempenho processual.

Em disparada, deu-se a criação de inúmeros meios para tornar o processo mais célere e, portanto, mais eficiente, dentre os quais merecem realce: o alargamento dos casos merecedores de tutela de urgência, o julgamento antecipado da lide, a sentença liminar de improcedência do pedido, as súmulas impeditivas de recurso, bem como as súmulas vinculantes e o processo judicial eletrônico. A regra (ao menos formalmente) passou a ser a da rapidez na entrega jurisdicional, com o fito de evitar o quanto possível a vagareza do processo.

Ainda como mecanismos de celeridade e desburocratização podem ser citados: a vedação de férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, a proporcionalidade do número de juízes à efetiva demanda judicial e à respectiva população, a distribuição imediata dos processos, em todos os graus de jurisdição, a possibilidade de delegação aos servidores do Judiciário para a prática de atos administrativos e atos de mero expediente sem caráter decisório, a necessidade de demonstração de repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para fins de conhecimento do recurso extraordinário e a instalação da justiça itinerante.

Obviamente que o sistema processual judiciário necessita de alterações infraconstitucionais, que privilegiem a solução dos conflitos, os meios alternativos para resolução das lides, a distribuição de justiça e maior segurança jurídica, afastando-se sempre de tecnicismos exagerados.

E o tempo, acreditou-se, foi vencido pela astúcia legislativa.

Ledo engano!

Proudhon disse que a “justiça, sob diversos nomes, governa o mundo, natureza e humanidade, ciência e consciência, lógica e moral, economia política, política, história, literatura e arte. (...) Que imaginar de mais universal, de mais forte, de mais perfeito do que a justiça?” (apud. PERELMAN, Chaïm. Ética e Direito. Trad. Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p.8).

O tempo

A justiça não pode vencer o tempo, não pode governá-lo nem ser-lhe mais perfeita ou imperfeita. A justiça só pode com ele conviver. Porque o mesmo tempo que transforma tudo em quase nada, que consome a vida e aos poucos as boas lembranças, leva também consigo a ideia de justiça (ainda que uma ideia utópica), de modo que para aquele que se relaciona com o processo no Direito é dado apenas dois caminhos a seguir: o da celeridade ou o da morosidade. Ambos, se não trilhados de forma a prestigiar o devido processo legal, levam a um único destino – a injustiça. Afinal, conforme bem esclarecido por Michael Sandel: “Justiça não é apenas a forma certa de distribuir as coisas. Ela também diz respeito à forma certa de avaliar as coisas” (“Justiça – o que é fazer a coisa certa”. Trad. Heloísa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, p.323).

No processo, o que verdadeiramente importa não é a luta contra o tempo, já que não se pode vencê-lo, mas a capacidade de se avaliar da maneira mais correta possível a demanda proposta, na luta contra as injustiças, poesia do trabalho.


Fonte: Site do JUS BRASIL

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